Poemaduro

Poemaduro
O que nos espera nestas páginas é um formato eclético de poesia que não se ocupa meramente em perseguir estilos predefinidos ou regras acadêmicas. Ao contrário, considerando-se que não há como se escapar aqui de algum tipo de impacto, "esbarraremos" em um poeta livre e original, que conduz sua criação, a um só tempo, com a leve candura de um colibri, mas com o vigor e a autonomia de uma águia dos desertos. Enquanto colibri, Mailton Rangel extrai de sua mais intimista subjetividade, toda uma complexidade de conteúdo com o mínimo de movimentos ou barulho, mostrando, às vezes, com as imagens e os silêncios de poucas palavras, muito mais do que os olhares displicentes possam captar. "Eu busco um lirismo forte / Uma espada / Um devaneio / E uma tocha... / Já não me espanto mais / Com flor que desabrocha / Quero um desabrochar... de rocha!" Já a águia, revela-se pela apurada acuidade visual, capaz de enxergar seus objetivos até quando distantes e camuflados sob carapaças. Isso se associa à determinação de lançar-lhes suas garras e sacudi-los, até que dali se transpareça uma essencialidade esquecida ou petrificada. "Por mim / Não existiria uma só praça / Com nome de general / Porque praça / É lugar de criança / E general que tem nome / Ainda hoje me lembra... Matança!"

Princípio do Enigmanismo

Princípio do Enigmanismo
Óleo sobre tela de Mailton Rangel

sábado, 24 de setembro de 2011

Contratempinho

CONTRATEMPINHO


Durante a fase de assentamento de toda aquela poeirada, enquanto ainda ocorria a organização orbital dos fragmentos oriundos da mais magnífica explosão de “nada” de todos os tempos... nunca se ouviu; porque o mentor supremo falava para si mesmo, ou seja: para o único ser digno – em qualquer lapso temporal – de ouvir-lhe as altíssimas e tonitruantes palavras; muito embora Ele, por uma modéstia irrepreensível, às vezes se alternasse em seu monólogo, entre toda a grandeza de sua singularidade ímpar e uma simplória primeira pessoa do plural:

– Ora, mas que ironia de uns dez tinos... – seu sotaque era nordestino – Criamos esses efeitozinhos para que, “a posteriori” – seu latim era fluente –, justificassem-se a existência das miniaturas que planejei para colorir e animar o transcurso obscuro dos milionênios... e um desses fragmentos insolentes me surpreende e avacalha dessa forma... E o pior... é que eu ainda nem permiti que se inventassem as farmácias ou os colírios nesse multi-versinho que acabo de fazer... Ah... mas deve ser só um torrãozinho de nada; eu nem vou esfregar, porque esse danado pode me incomodar mais ainda!... Talvez essa porcariazinha, com o tempo, derreta-se sozinha e saia, durante meu sono ou pelo fluxo de uma esporádica lágrima ocasionada por minha reação orgânica!

E foi a partir desse momento que aquele planetinha se restava fadado a permanecer boiando na liquidez plácida e azul da íris do olho esquerdo de Deus, até que Este, por um possível incômodo mais acentuado com o referido cisco – o que felizmente ainda não ocorreu – recorresse a um bom oftalmologista, com o fito de retirar a coisa de ambas as órbitas e despojá-la numa lixeira cósmica qualquer.



(Mailton Rangel)

2 comentários:

  1. texto de gente grande. dá abertura de mil leituras para mil lugares. não há como não sorrir com a liberdade com que escreves.

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  2. Que bacana, Creito, ver você aqui com esse carinho especial...
    Abração!

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